Embora representem apenas 6% da população global, os povos indígenas protegem 80% da biodiversidade remanescente do planeta. Ainda assim, eles recebem menos de 1% do financiamento internacional para o clima.

Este desequilíbrio é o destaque em um novo relatório lançado esta semana durante a 24ª sessão do Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas.

Rio Tapajós, na Amazônia. A mineração em terras indígenas cresceu 625% entre 2011 e 2021, no Brasil.

Injustiças dentro dos esforços de ação climática

O documento “A Situação Mundial dos Povos Indígenas” indica que existem muitos sinais de injustiça dentro dos esforços de ação climática. Eles vão desde projetos de energia verde impostos sem consentimento a decisões políticas tomadas em salas onde as vozes indígenas estão ausentes.

Como resultado, essas comunidades são frequentemente excluídas das soluções climáticas, deslocadas por elas e privadas dos recursos necessários para liderar o caminho.

A publicação, supervisionada pela ONU, reúne contribuições de líderes indígenas, pesquisadores e da Organização Mundial da Saúde, OMS, com estudos de caso, dados e experiências vividas em sete regiões distintas do mundo.

O relatório defende uma mudança radical na forma como o conhecimento destes povos é compreendido e respeitado, de modo que deixem de ser denominados como “tradicional” ou folclórico e passem a ser encarados como científico e técnico.

Valorização do conhecimento técnico dos povos indígenas

Os autores argumentam que os sistemas de conhecimento indígena são “testados pelo tempo, orientados por métodos” e construídos em relações diretas com ecossistemas que sustentam a vida há milênios.

Por exemplo, no Peru, uma comunidade quéchua, em Ayacucho, reviveu práticas de semeadura e coleta de água para se adaptar ao encolhimento das geleiras e à seca.

Esses métodos, que fazem parte da administração ancestral dos ciclos hidrológicos, agora estão sendo compartilhados através das fronteiras com agricultores costarriquenhos como um modelo de cooperação climática Sul-Sul.

Na Somália, as tradições orais servem como lei ecológica. O relatório cita normas culturais, como a proibição do corte de certas árvores, gurmo go’na, como evidência de governança ambiental integrada na sabedoria geracional, transmitida por meio de provérbios, histórias e tabus, e não por meio de documentos políticos.

Já o povo Comcaac, do México, codifica conhecimentos ecológicos e marítimos em sua língua. Nomes como Moosni Oofia, onde as tartarugas-verdes se reúnem, e Tosni Iti Ihiiquet, onde os pelicanos chocam, atuam como dados vivos, vitais para sua sobrevivência.

Unicef/Lebon Chansard Ziavoula

Os Povos Indígenas possuem conhecimentos valiosos transmitidos através de gerações. Na foto aqui, uma comunidade na República do Congo

Danos colaterais das soluções verdes

O relatório também analisa o risco de os povos indígenas sofrerem danos colaterais da adoção de energias renováveis.

Para o presidente do Fórum Permanente da ONU sobre Questões Indígenas, Hindou Oumarou Ibrahim, “as chamadas soluções verdes frequentemente representam uma ameaça aos povos indígenas tão grande quanto a própria crise climática”.

O também autor do prefácio do relatório ressalta que a nova economia frequentemente se baseia em “velhas injustiças”, que vão desde a expansão dos biocombustíveis, passando por esquemas de compensação de carbono até a extração de minerais para tecnologias de energia limpa.

Em vários países das Américas, projetos de compensação de carbono vinculados à conservação florestal foram implementados sem consulta, frequentemente em terras indígenas, resultando em degradação ambiental.

O relatório afirma que se as ações climáticas continuarem a ser concebidas e implementadas sem os povos indígenas no centro, há o risco de replicar os “sistemas extrativistas e excludentes que alimentaram a crise em primeiro lugar”.

A mudança climática é uma crise de saúde

O relatório também inclui um capítulo encomendado pela OMS, que detalha como os impactos climáticos na saúde se interconectam com a vida social, cultural e espiritual das comunidades indígenas.

No Ártico, mudanças na temperatura, migração da vida selvagem e padrões climáticos estão interrompendo práticas tradicionais como caça e colheita. Essas interrupções estão causando estresse e ameaçando a segurança alimentar.

As mulheres indígenas são particularmente afetadas pela interseção entre mudança climática e saúde. Na África Oriental, por exemplo, as mulheres são mais vulneráveis ​​a doenças tropicais negligenciadas, como esquistossomose, leishmaniose e helmintíases transmitidas pelo solo.

Na Amazônia, a perda de biodiversidade induzida pelo clima reduziu o acesso a alimentos tradicionais e plantas medicinais, contribuindo para deficiências nutricionais entre mulheres grávidas e lactantes.

Apesar desses desafios, o relatório enfatiza a resiliência. As comunidades estão implementando estratégias de adaptação com raízes locais, frequentemente lideradas por mulheres e idosos. Essas estratégias incluem a restauração de dietas tradicionais, o fortalecimento do compartilhamento intergeracional de conhecimento e a adaptação dos calendários de colheita a novos ritmos ecológicos.

Marcelo Camargo/Agência Brasil

Indígenas da etnia Yanomami, em acampamento em Brasília.

Excluídos das decisões e do financiamento

Embora os povos indígenas sejam cada vez mais reconhecidos nas estruturas ambientais globais, o relatório revela que seu papel na formulação e implementação de políticas climáticas permanece severamente limitado, tanto em termos de financiamento quanto de governança.

As comunidades indígenas continuam enfrentando barreiras estruturais que fazem com que elas recebam menos de 1% do financiamento climático internacional.

Entre as principais recomendações, o relatório propõe a criação de mecanismos financeiros liderados por povos indígenas, o reconhecimento formal dos sistemas de governança indígena. 

Source of original article: United Nations / Nações Unidas (news.un.org). Photo credit: UN. The content of this article does not necessarily reflect the views or opinion of Global Diaspora News (www.globaldiasporanews.net).

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