Um novo relatório conjunto de três agências das Nações Unidas revela um cenário contrastante no Sudão: onde a guerra cede, a esperança renasce; onde o conflito persiste, a fome avança.
Segundo a última análise da Classificação Integrada da Segurança Alimentar, IPC, as cidades de Al Fasher e Kadugli vivem agora em condições de fome, com milhões de pessoas em risco de morte.
Fome confirmada em zonas sob cerco
O documento foi produzido pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, FAO, do Programa Mundial de Alimentos, WFP, e do Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef,
De acordo com o Comité de Revisão da Fome, FRC, há provas razoáveis de que a fome está a ocorrer em Al Fasher, no Norte do Darfur, e em Kadugli, no Sul do Kordofan: duas cidades praticamente cortadas de suprimentos comerciais e ajuda humanitária. Especialistas alertam que esta é a segunda vez, em menos de um ano, que a FRC confirma a ocorrência de fome em partes do Sudão.
Nestas áreas, os limiares críticos de consumo alimentar, desnutrição aguda e mortalidade já foram ultrapassados, com pelo menos 375 mil pessoas em situação de “catástrofe”, IPC Fase 5, e outros 6,3 milhões em “Emergência”, IPC Fase 4, enfrentando lacunas extremas de alimentação e nutrição.
O relatório indica que a fome deverá persistir até janeiro de 2026 em Al Fasher e Kadugli, e que 20 outras localidades em Darfur e Kordofan enfrentam risco elevado de chegar à mesma situação. As restrições à ajuda humanitária e a escalada do conflito tornam impossível prever o impacto total, mas estima-se que mais de 841 mil pessoas estejam em áreas “não classificáveis” pela IPC devido à insegurança e à ausência de dados fiáveis.
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Desnutrição extrema e colapso sanitário
A situação é agravada por surtos de cólera, malária e sarampo, que se espalham rapidamente em regiões onde os sistemas de saúde, água e saneamento colapsaram, aumentando o risco de morte, sobretudo entre crianças. Segundo dados da IPC, as taxas de desnutrição aguda global atingem entre 38% e 75% em Al Fasher e 29% em Kadugli.
Lucia Elmi, diretora de operações de emergência da Unicef, alertou que “a combinação letal de fome, doença e deslocamento está a colocar milhões de crianças em risco”, destacando que meninas são especialmente vulneráveis à desnutrição, violência e abandono escolar. Ela reforçou que “ter acesso seguro e rápido é uma questão de vida ou morte”, enfatizando que é necessário chegar às crianças antes que seja tarde.
A análise da IPC baseou-se em mais de 40 levantamentos de nutrição e mortalidade, dados de satélite e entrevistas com informantes-chave. Os especialistas constataram que em Kadugli, por exemplo, o preço do sorgo aumentou 437% entre maio e agosto de 2025, forçando famílias a sobreviver com restos de ração animal, cascas de amendoim, ervas e folhas fervidas. Em Al Fasher, 96% das famílias relataram dormir com fome e 57% passaram pelo menos um dia inteiro sem comer.
Melhoria limitada onde os combates diminuíram
Apesar do cenário dramático em grande parte do país, algumas áreas registam ligeira recuperação, especialmente em Cartum, Al Jazirah e Sennar, onde os combates abrandaram desde maio. Famílias começam a regressar, mercados reabrem e o comércio retoma gradualmente. Graças a essa estabilização e às condições agrícolas favoráveis, o número de pessoas em situação crítica de fome caiu de 24 milhões para 21,2 milhões, 45% da população.
Rein Paulsen, diretor de emergências e resiliência da FAO, explicou que “sementes, ferramentas e gado são linhas de vida para milhões de sudaneses”, e que restabelecer a produção agrícola local é essencial para travar a fome. As boas condições agrícolas esperadas após a colheita e no início de 2026 poderão reduzir ligeiramente os níveis de insegurança alimentar para 19,3 milhões de pessoas, embora essas melhorias continuem frágeis e limitadas.
Ainda assim, mais de 60% das localidades avaliadas apresentam taxas de desnutrição acima de 15%, com várias regiões de Darfur ultrapassando o limiar de 30% considerado indicador de fome. As populações de Darfur e Kordofan representam 98% de todos os casos de emergência alimentar e fome no país.
Ross Smith, diretor de emergências do WFP, destacou que o conflito continua a decidir “quem come e quem não come”: “Mesmo com avanços, milhões permanecem inatingíveis. O WFP tem conseguido entregar ajuda alimentar vital a mais de 4 milhões de pessoas por mês, mas sem financiamento adicional e acesso sustentado, não conseguiremos travar a propagação da fome.”
Mulheres em uma clínica de saúde materna e de desnutrição administrada pelo Unfpa em Tawila, Sudão
Impacto avassalador do conflito prolongado
As três agências da ONU reforçam que o principal motor da fome é o conflito, que impede o acesso humanitário e destrói os meios de subsistência. Em várias regiões do Darfur e Kordofan, comunidades inteiras enfrentam meses sem alimentos, mercados colapsados e preços exorbitantes. O conflito, a deslocação e o colapso de serviços básicos são os principais motores da crise, agravada por uma inflação descontrolada e uma moeda em rápida desvalorização.
Mais de 9,6 milhões de pessoas continuam deslocadas internamente, e cerca de 80% das instalações de saúde do país estão danificadas ou inoperacionais. A ajuda humanitária enfrenta saques, bloqueios administrativos e restrições de segurança, impedindo a entrega de suprimentos essenciais.
Chamado urgente à ação internacional
A ONU e parceiros apelam à cessação imediata das hostilidades, à proteção dos civis, à garantia de acesso seguro e sustentado e ao reforço do financiamento para ampliar a resposta multissetorial, priorizando as áreas mais afetadas.
Também pedem o levantamento de barreiras burocráticas que dificultam a recolha de dados e a entrega de assistência, enfatizando que apenas um cessar-fogo duradouro e o livre acesso humanitário poderão travar a fome e salvar vidas.
O alerta é claro: sem paz, acesso humanitário e financiamento adequado, o Sudão permanecerá o maior foco de insegurança alimentar do mundo; uma nação debilitada, onde a fome já não é uma ameaça distante, mas uma dolorosa realidade diária.
Source of original article: United Nations / Nações Unidas (news.un.org). Photo credit: UN. The content of this article does not necessarily reflect the views or opinion of Global Diaspora News (www.globaldiasporanews.net).
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